A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) do Senado Federal promoveu nesta sexta-feira (10.12) audiência pública remota para discutir um projeto que altera a revisão da Lei de Cotas que será debatida no Congresso em 2022.
De autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), o PL 4656/2020 propõe que a Lei 12.711/2012 que assegura a reserva de vagas em universidades públicas e institutos federais para negros, indígenas, alunos de baixa renda e estudantes de escolas públicas seja reavaliada a cada 10 anos para efetuar ajustes necessários.
O senador abriu a audiência destacando que “o Congresso Nacional precisa reafirmar essa política exemplar que registra durante a sua vigência o crescimento de quase 400% de alunos negros e negras no ensino superior.” Lembrou, no entanto, que esse percentual representa apenas 38,15% de alunos matriculados diante de 56% da população negra brasileira.
Entre os expositores, o professor José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, afirmou que “o Brasil não ainda conseguiu cumprir com uma meta que é exigível para a sua própria sobrevivência: a formação de estoques de recursos humanos de pelo menos 25% de estudantes em idade escolar nas universidades públicas, sendo que a maioria sem acesso é de jovens pobres e negros.” Ele lembrou também que um país que chegou a ser a quinta potência econômica mundial no passado tem o compromisso de adotar um processo educativo amplo que contemple todos os talentos para poder crescer novamente e se desenvolver, atendendo às demandas da sociedade e fazer frente aos atuais desafios.
Bruna Chaves Brelaz, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) reforçou que “ o Congresso precisa entender que as cotas devem ser renovadas e ampliadas, já que é o povo negro quem mais sofre por não ter avançado na ascensão social”. Brelaz destacou ainda que “além do acesso ao ensino superior é preciso debater políticas públicas para a permanência dos estudantes nas universidades.”
Para Luciana de Oliveira Dias, professora da Universidade Federal de Goiás e diretora da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), as ações afirmativas, como a Lei de Cotas, são formas de enfrentamento do racismo estrutural e da exclusão. “É papel do Estado atuar como reparador para avançar na igualdade social e valorizar saberes historicamente discriminados”, complementou.
Frei David dos Santos, diretor-executivo do projeto Educafro, enfatizou a importância de ações de combate às fraudes nas cotas, que ocorrem sobretudo em cursos muito concorridos, como Medicina, Odontologia e Direito.
Helderli Fideliz Castro de Sá Leão Alves, presidente da Nação Mestiça e Conselheira Nacional de Igualdade Racial, apresentou como sugestão a criação de cotas exclusivas para pardos, separadas das cotas direcionadas a negros.
Ela explicou que a medida é necessária para evitar a discriminação, tendo em vista que os pardos não apresentam fenótipos de negros, mas de índios, a exemplo dos estados do Amazonas, Roraima, Mato Grosso e Paraíba, “ Isso prejudica a classificação em concursos e acesso a políticas de ações afirmativas.” Reforçou ainda que “classificar pardos como negros vai contra a classificação como raça do IBGE, que define pardos como mestiços e os distingue de pretos”.
Lívia Sant’ Anna Vaz, promotora de Justiça do Ministério Público da Bahia, disse que a métrica de avaliação das cotas não deve ser apenas pautada pelo número de negros que ingressam nas universidades, porque essas pessoas não estão conseguindo sair formadas, por falta de uma política efetiva de permanência. Ressaltou também que a cota é uma ação afirmativa para garantir o mínimo da presença de negros nos espaços de decisão e poder. “No entanto, precisamos pensar em mecanismos legais para que o racismo estrutural não faça com que esse mínimo vire o máximo”.